A Olho Nu
Rômulo Brunieri
Parei pra notar as estrelas, lindas, fascinantes, isso nos
faz questionar muitas coisas. Dentre as coisas a questionar, a lógica, o espaço
o comum que não notamos sempre. Somos um pingo de chuva ao entardecer, um
pedaço com vida e consciência. Lembrei-me do incomum, do que não fiz e daquilo
que desejo fazer. Todos nós ansiamos algo, porém, farto de tudo, é um absurdo
deixar de fazer muito daquilo que desejamos. Vejo daqui, lá longe as formas das
nuvens que ainda restam na noite. As vejo pouco, quase sumindo, no transparecer
da forma presa ao vento, vejo uma estrela de brilho forte, a maior delas.
Guardei minhas vistas durante o dia pra ver o céu infinito estender-se sobre a
terra, e daqui vejo luzes no céu, não vidas já passadas, nem anjos como contam
os mais vividos, são astros, um fascínio, um conforto sadio de ver mínimas
lâmpadas por todos os lados, como enfeites presos em barbantes baratos. De pés
no chão, meus olhos decolam, é uma pena não poder tocar a ponta do astro que
vive da noite, um filho do céu, um projeto de luz desconcertante, inspiração
aos poetas e fonte de delírio para os amantes. Brasa pingada, vagalumes
amarrados, quadros pintados por Deus além da superfície, intocável desenho de
luz, forma que fascina e arranha a sola dos meus pés no momentâneo desejar.
Célebre convidado de todos os palcos, faróis enigmáticos de pontas amareladas.
Sábios calados, ouvidores dos prantos, ladrilho do céu composto de brilho. Vejo
a imensidão do distante, imagino o quanto somos pequenos diante de tão grande
espaço, é incrível, é inacreditável imaginar inúmeras galáxias derramando-se
por cima de nós. Olhando minhas mãos, a matéria torna fácil o delírio, pois a
carne surgiria de onde, moldada por mãos? Juntas desenhadas? É loucura demais,
é fácil demais se perder.
Sinto-me parte de tudo e se eu pudesse voar até lá, eu
faria. Mas nunca tive asas, quem me dera tê-las, a lógica afugentou o sonho de
menino, que ainda pequeno viu em um livro, um menino de asas, na história
contada, o menino voava pra onde queria isso porque era um sonho escrito,
apenas isso, nada possível. Ilusão comum de um viajante que está com os pés no
chão, preso na tal gravidade em uma terra sustentada por sangue, mas em
compensação nela se pode sonhar. Tão longe é meu sonho, criado daqui,
construído por tudo, composto em vida e tão lógico aos viajantes que ousam
escrever no céu, sem folhas nem tinta, apenas com lágrimas de luz que na ponta
dos dedos põe-se a escorrer, mancham se você souber manchar, porém, são frias,
salgadas e adoram prender-se ao vento. Tanto falei das luzes, das cores do
sonhar, da loucura injetada nas vias sanguíneas através de questões sobre a
existência, vida, morte, passado e presente, futuro, estações e o amor. Falei
da velhice, da lembrança, dos nomes e o céu. Tanto falei de mim, das poucas
coisas, do exagero diário em querer viver mais e mais minha vida, dos saberes
ocultos em palavras escritas e palavras ditas e não ditas, na carícia guardada,
no carinho palavreado, no lábio mais sorridente e dos músculos mais machucados.
Tanto de falei da infância, das brigas com Deus, das desculpas perdidas, e de
todo aquele fascínio superficial. Tanto falei em me perder, em cair nos risos
com aqueles que amamos, esquecer do ódio de punhos abertos, querendo amar, como
se não houvesse algo mais. Tanto falei dos motivos, nas explicações absurdas,
nos dias mais frios, nos momentos mais importunos. Tanto foi vaga minha luta,
no desejo natural e individual sobre a minha geração. Tanto falei de boca
fechada sobre o palco sem brilho, no variável desejo de recitar. Tanto falei
das estrelas e olhei para o céu que me perdi no instante, em um caminho curto, onde
a olho nu consigo enxergar os poetas e seus tormentos, criadores de mistério,
decifradores do amor e suas metáforas iludidas, presos em suas próprias
correntes.
Aprecio o sereno enquanto houver tempo, e quando eu deixar
de viver, basta saber que eu soube sonhar e aprendi a amar. Por isso escrevi às
estrelas.
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