PLURIVERSOS

Revista Independente de Literatura

Mia Couto mostra o animal que é o ser humano em “A Confissão da Leoa”







Mia Couto mostra o animal que é o ser humano em “A Confissão da Leoa”
Equipe Pluriversos


                
           Uma Kulumani que lembra a Comala de Juan Rulfo, com destinos marcados, entrecortados pela dor, e pela voracidade felina da existência. O fado da vida, a constatação da inutilidade da existência, o entender de que não há como escapar nem da morte nem da vida, pois ambas se embaralham e se entrecruzam. Eis uma obra de inquestionável valor, um romance pertencente à alta literatura de um dos maiores escritores da belíssima língua portuguesa. Eis A Confissão da Leoa do moçambicano Mia Couto.
               As personagens demonstram um grande conhecimento sobre a vida, a natureza, a fatalidade, e mesmo as mais simples demonstram uma grande inteligência e percepção das coisas. Essa existência, pisada tal “Macabéia”, leva, por exemplo, um camponês a dizer “Querem saber como morremos? Mas nunca ninguém veio saber como vivemos”.
               O romance é narrado em primeira pessoa por duas personagens, um caçador chamado Arcanjo Baleeiro e Mariamar, uma moça da aldeia de Kulumani, que sofre seguidamente por ataques de leão. Os capítulos se alternam entre um narrador e outro que contam os problemas da população em resolver os problemas do ataque. Baleeiro, conhecido por ser um exímio caçador, é chamado à aldeia para matar o felino que aterroriza a população. Entre as caçadas, conhecemos sua história, seu irmão eternamente doente, sua paixão pela cunhada, sua dor de ter o pai que teve, caçador como ele. Mariamar sofre com os abusos do pai, com a perda da irmã, com a saudade do avô já morto, e com a indiferença da mãe, que chora ainda pela irmã morta. Pouco a pouco, Mariamar vai nos revelando também sua história, e se mostra também leoa, também habitante daquelas florestas, mas marcada para sofrer na sua solidão de felina.
               Contudo, o romance vai muito além, discutindo inclusive a herança deixada pelas guerras contra os portugueses, a rudez da população em uma terra que parece marcada pelo sofrimento e pela morte, e pela inversão completa, perversos são os humanos e não os leões. Regado de lirismo, e flertando com o fantástico, A confissão da Leoa é um daqueles romances que, ao terminá-lo, deixam-nos muito felizes por sermos nativos e falantes da língua portuguesa, tendo o prazer de lê-lo no original.



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