PLURIVERSOS

Revista Independente de Literatura

O UNIVERSO DE MANUEL HERZOG




O UNIVERSO DE MANOEL HERZOG
Por Luigi Ricciardi

            Embora tenha sido finalista do Prêmio SESC e publicado outros livros anteriormente, Manoel Herzog deu o seu primeiro grande salto literário com o livro “Companhia Brasileira de Alquimia”, publicado pela editora Patuá em 2013 e que recebeu apoio cultural da prefeitura de Santos no ano anterior. A mesma editora publicou posteriormente os livros “A comédia de Alissia Bloom” e “O evangelista”, em 2014 e 2015 respectivamente. Recentemente, agora pela Alfaguara, o escritor santista publicou “A jaca do cemitério é mais doce”.
            Tal como Luiz Ruffato, que aproveita uma lacuna na literatura nacional escrevendo sobre o proletariado do interior mineiro entre a segunda guerra mundial e o governo Lula, Manoel Herzog também dá voz a personagens que são pouco vistos na literatura de nosso país ou que são, quando aparecem, quase sempre caricaturados. Nenhum dos dois, felizmente, constrói seus textos de modo panfletário.
            Cubatão, cidade que carregou durante muito tempo a marca de ser a mais poluída do Brasil, é o centro do universo de ação de alguns romances de Herzog, tanto no entorno como dentro da Companhia Brasileira de Alquimia, empresa que na ficção emprega boa parte da população de Cubatão e das cidades vizinhas. Seus empregados representam a maioria dos personagens retratados nas obras.
            Em “CBA”, o protagonista é Germano Quaresma, apelidado de Poeta pelos companheiros. Quaresma trabalha a maior parte do tempo no turno da noite na Companhia e mora em Santos. É casado com uma estudante de letras e odeia a universidade. Entretanto, é fã de literatura clássica e contemporânea e escreve poesias. Leitor voraz e profundo conhecedor da arte da palavra, chama os escritores de grandes amigos e diz que conheceu a maioria.
            Um investigador de polícia, que aparece na Companhia para investigar a morte de um dos trabalhadores, é uma espécie de duplo de Quaresma. Também dado a rabiscar versos, o investigador é beletrista e tem uma certa admiração pelo empregado da CBA. Fisicamente são extremamente parecidos e por vezes as pessoas os confundem. Os dois personagens também aparecem em “A jaca do cemitério é mais doce” e também são confundidos.
            Se o primeiro romance é dotado de um grande poder de ironia fina e de um sarcasmo retumbante, o último é marcado por uma prosa um pouco mais “sisuda”, mas que expande um pouco mais o campo de atuação. A história se passa também em Cubatão, mas o protagonista agora é Santiago, que conquistou um posto de empregado na empresa mais desejada da cidade, a própria CBA. Trabalhar lá é ter garantia de certo status na região, pois o salário não é ruim e há muitos benefícios. Santiago é apaixonado por Natércia, uma colega de turma que não lhe dava bola quando criança. Nos bailes da cidade, eles se encontram e Natércia se apaixona pelo homem que sabe bem lhe conduzir pelos salões de samba.
Natércia é descendente de polonesas que vieram para o Brasil e se tornaram prostitutas na baixada. Estão todas enterradas no cemitério israelita de Cubatão, onde há uma jaqueira, que produz a jaca mais doce do lugar. Há aí uma ótima espécie de antimetáfora da vida que levavam essas imigrantes que vinham de tão longe. Segundo as más línguas das personagens, Natércia, que ao que tudo indica traiu Santiago, herda o “sangue maldito” dessas polonesas ninfomaníacas.

            O romance é bem construído e surpreendente. Após uma tragédia, a narrativa vai tecendo caminhos de diálogos com a loucura, o arrependimento, a raiva, entre outros. Herzog muda e acerta no tom, colaborando na edificação de novos espaços na literatura brasileira, antes não retratados, temperando sua narrativa com um belo resgate histórico e recheando-o com personagens fora do padrão clássico da literatura brasileira. Recomendadíssimo!

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